quinta-feira, 15 de abril de 2010

Para o 5º e 6º ano



Adjectivos - Comparativos e superlativos irregulares

Adjectivos - Comparativos e superlativos irregulares
«Grande Dicionário Universal - Língua Portuguesa» - Gramática - Morfologia

Adjectivo

Comparativo de
Superioridade

Superlativo

Absoluto

Relativo

bom

melhor

óptimo

o melhor

maupiorpéssimoo pior
grandemaiormáximoo maior
pequenomenormínimoo menor





Sinais de pontuação


    Sabes porquê que existem os sinais de pontuação na linguagem escrita?

    Existem para facilitar a leitura e ajudar na interpretação do texto.

  • Ponto final (.) usa-se no final da frase e obriga a fazer uma paragem;
  • Ponto de exclamação (!) - utiliza-se quando desejamos exprimir admiração, surpresa, receio, etc.;
  • Ponto de interrogação (?)- usa-se para fazer uma pergunta;
  • Vírgula (,) - separa os elementos da frase e permite marcar uma pequena pausa;
  • Ponto e vírgula (;) - usa-se para separar orações coordenadas; obriga a uma pausa mas não termina a frase;
  • Dois pontos (:) - usam-se antes de uma citação ou de uma enumeração.
  • in, sítio das palavras - gramática

Deixo-te aqui um texto inédito da escritora Alice Vieira

«Eu sou o maior»

«O Ponto Final, a Vírgula e o Ponto de Interrogação tentavam descobrir qual deles era o mais importante.

- Quem é que faz todas as perguntas? Quem é que põe todas as dúvidas? Alguém duvida que o mais importante sou eu? - disse o Ponto de Interrogação.
- Eu sou a resposta a todas as perguntas. O fim de todas as discussões. Eu sou o mais importante - disse o Ponto Final.
- E tu serves para quê? - perguntou o Ponto de Interrogação à Vírgula. E a Vírgula respondeu:

- Experimentem dizer: “Ana Teresa Maria José Rita Sofia eram da mesma família!”.
Sem mim, quantos irmãos tem a família?
- Seis - disse o Ponto Final.
- Serão mesmo seis? - perguntou o Ponto de Interrogação.
- Comigo, podem ser apenas três: “Ana Teresa, Maria José, Rita Sofia”. Mas também podem ser quatro: “Ana, Teresa, Maria José, Rita Sofia”. Sem mim, nunca saberão.
- Pronto - disse o Ponto Final.
- Digamos que valemos todos o mesmo. Sem pontos, vírgulas e pontos de interrogação, as palavras andavam todas perdidas pelo meio das histórias».

Lembra-te:

Para facilitar a leitura e ajudar à compreensão dos textos, na linguagem escrita usam-se sinais de pontuação:
ponto final - usa-se no final da frase e obriga o leitor a uma paragem;
vírgula - separa os elementos da frase; marca uma pequena pausa;
dois pontos - usam-se antes de uma citação ou de uma enumeração;
ponto e vírgula - usa-se para separar orações coordenadas; obriga a uma pausa mas não termina a frase;
ponto de exclamação - utiliza-se quando se deseja exprimir surpresa, receio, admiração, etc.;
ponto de interrogação - usa-se para fazer uma pergunta;
reticências - indicam que a frase está incompleta; assinalam uma hesitação ou uma pausa;
travessão - utiliza-se nos diálogos para indicar a fala das personagens;
aspas - introduzem palavras ou citações de outros textos;
parêntesis - assinalam informações diversas.











quarta-feira, 31 de março de 2010

A Batalha de Aljubarrota nos Lusíadas

Os Lusíadas (episódio da Batalha de Aljubarrota)

Batalha de Aljubarrota (est. 28 a 45)



Tema e divisão em partes:

O texto, cujo tema é a descrição da batalha de Aljubarrota, pode dividir-se em três partes lógicas. A primeira parte (28 e 29) constitui uma espécie de introdução, em que o poeta assinala o terrível efeito provocado, na natureza e nas pessoas, pelo espantoso sinal lançado pela trombeta castelhana para o começo da batalha. A segunda parte - desenvolvimento (de 30 a 42) é a descrição propriamente dita da batalha (entrecortada por um comentário emotivo do poeta na estrofe 33), em que se realça a acção de Nuno Álvares (30, 34 e 35), o movimento terrificamente barulhento e confuso da refrega (31), a referência aos irmãos de Nuno Álvares que lutavam do lado dos castelhanos e respectivo comentário do poeta (32 e 33), a acção de D. João I, que, como chefe e rei, a todos entusiasmava não só com palavras, mas também com o exemplo (entre as setas dos inimigos corro e vou primeiro).

Finalmente, a terceira e última parte – conclusão (43-45) apresenta-nos a desmoraliza ção e fuga desastrosa dos castelhanos e a vitória eufórica dos portugueses.



Primeira parte – Introdução (est. 28 e 29)

Síntese

A trombeta castelhana dá o sinal para a guerra e este ecoa por toda a Península Ibérica, desde o Cabo Finisterra ao Guadiana, desde o Douro ao Alentejo. As mães apertam os filhos contra os peitos. Há rostos sem cor e o terror é grande, muitas vezes maior do que o próprio perigo. Durante o combate as pessoas, com o furor de vencer, esquecem-se do perigo e da possibilidade de ficarem feridas ou mesmo de perderem a própria vida.

Análise estilística das estrofes 28 e 29:



0 poeta realça logo o tremendo sinal de combate, dado pelos castelhanos, por meio dos adjectivos horrendo, fero, ingente, temeroso, som terríbil. Com o fim de realçar o efeito produzido por esse tremendo som da trombeta caste- lhana, há a personificação de seres da natureza física (o monte, os rios) que, eles próprios, tremeram frente a esse terrível sinal de guerra. Associada à personificação surge também a hipérbole: o Guadiana atrás tornou as ondas de medroso; correu ao mar o Tejo duvidoso. Como símbolo do medo e terror deste som da guerra aparece a ternura das mães, aos peitos os filhinhos aper­tando. O efeito deste sinal de guerra é ainda realçado pelos rostos macilentos (quantos rostos ali se vêem sem cor). Para realçar este pavor que precedeu a própria batalha, o poeta afirma, a jeito de conclusão, que nos perigos grandes, o temor é maior muitas vezes que o perigo.



Segunda parte – Desenvolvimento (est. 30 a 42)



Síntese

A guerra começa. Uns são movidos pela defesa da sua própria terra e outros pelo desejo de vitória. Os inimigos são muito numerosos, mas os portugueses defendem-se com bravura. D. Nuno Álvares Pereira destaca-se na luta. D. Diogo e D. Pedro Pereira, irmãos de Nuno Álvares Pereira, estão a combater contra ele, “(caso feio e cruel)” – no entanto, não tão grave como combater contra o rei e a pátria. No primeiro esquadrão há portugueses que renegaram a pátria e combatem contra seus irmãos. D. João I, sabendo que D. Nuno Álvares corria perigo, acudiu à linha da frente para apoiar os guerreiros com a sua presença e palavras de encorajamento e, com um único tiro, matou muitos adversários. Depois desta situação, os portugueses mais entusiasmados lutam sem recearem perder a vida. Muitos são feridos, muitos morrem, mas a bandeira castelhana é derrubada aos pés da lusitana.

Com a queda da bandeira castelhana, a batalha tornou-se ainda mais cruel. Sem forças para combaterem, os castelhanos começam a fugir e o rei de Castela vê-se derrotado e impedido de atingir o seu propósito.

Análise estilística da estrofe 31:



Na estrofe 31 note-se a expressividade dos adjectivos: espesso ar (a salientar que a própria atmosfera se mostrava de ar carregado),estridentes farpões, pés duros, ardentes cavalos, duras armas; a expressividade dos verbos: tiros voavam, treme a terra; valessoam, espedaçam-se as lanças, tudo atroam, re crescem os inimigos. Há também a inversão da ordem das palavras (hipérbato), ao gosto clássico. Mas o que mais impressiona nesta estrofe é a admirável har monia imitativa (onomatopaica) que existe entre o seu corpo fónico e o baru lho da batalha. Como exemplo, aponte-se a frequência das sibilantes dos três primeiros versos e do 5º, sugerindo o sibilar das setas; as aliterações verificadas sobretudo nos versos 3º e 6º; a frequência dos rr, sobretudo no versos 2º, 4º e 6º, imitando o som ríspido e rude da refrega. Há ainda o ritmo próprio do verso heróico, com os acentos na sexta e décima sílabas, a alternância de ritmos (binário e ternário) e a frequência das oclusivas (p, t, d, b, c), tudo isto sugerindo, sobretudo nos quatro primeiros versos, o tropel dos cavalos. Observe-se, finalmente, o trocadilho nos dois últimos versos pouca e apouca.

Em poucos textos da nossa literatura o significante terá tanta importância como nesta estrofe 31, para dar visualidade e impressionismo à mensagem.

Aqui as palavras valem quase tanto pelo seu corpo fónico (significante) como pelo seu significado, na construção da mensagem. Veja-se como o corpo fónico das palavras sublinha o seu significado nestes dois versos, em que as aliterações e a sucessão de sibilantes se aliam ao encavalgamento, para sugerirem a catadupa do estilhaçar de lanças e armas nas sucessivas quedas:

Espedaçam-se as lanças, e as frequentes

Quedas com as duras armas tudo atroam.



Intenção e efeito da estrofe 33:



Esta intervenção emocional do poeta, apostrofando célebres traidores da pátria, serve para, a jeito de coro na tragédia, pôr em evidência e comentar o caso feio e cruel de dois irmãos de Nuno Álvares se encontrarem do lado dos castelhanos, lutando contra a sua pátria e contra seu irmão. A descrição da batalha é um episódio essencialmente cavaleiresco, dominado do princípio ao fim pela bravura patriótica de Nuno Álvares. O facto de surgirem dois irmãos, como ele portugueses (esses renegados), lutando contra a pátria e contra o irmão, além de conferir maior dramatismo à descrição pelo que há de chocante em semelhante traição, vem realçar a figura impolutamente patriótica de Nuno Álvares. A descrição da batalha de Aljubarrota é-nos dada pelo poeta sobretudo como um quadro exaltador de Nuno Álvares.



Terceira parte – Conclusão (est. 43 a 45)

Síntese

Os castelhanos fogem vencidos e encobrem a dor das mortes, a mágoa, a desonra, maldizendo e blasfemando de quem inventou a guerra ou atribuindo a culpa à sede de poder e à cobiça. D. João I passa alguns dias no campo de batalha para comemorar e agradecer a Deus a vitória com ofertas e romarias, mas D. Nuno Álvares Pereira, que só quer ser recordado pelos feitos bélicos, desloca-se para o Alentejo

http://mym-pt.blogspot.com/2009/05/batalha-de-aljubarrota.html

Felizmente Há Luar - síntese Ensino sec.

Felizmente Há Luar!

Síntese

A obra


A peça em dois actos Felizmente Há Luar!, de Sttau Monteiro, publicada em 1961 e com a qual ganhou o Grande Prémio de Teatro da Associação Portuguesa de Escritores, foi suprimida(não autorizada), pela censura da ditadura; representada pela primeira vez em 1969, (séc. XX) em Paris, só chegaria aos palcos portugueses em 1978, no Teatro Nacional, encenada pelo próprio autor.
Esta peça de estreia de Sttau Monteiro tem como cenário o ambiente político dos inícios do século XIX: em 1817, uma conspiração, encabeçada pelo general Gomes Freire de Andrade, que pretendia o regresso do Brasil do rei D. João VI e que se manifestava contrária à presença inglesa, foi descoberta e reprimida com muita severidade: os conspiradores, acusados de traição à pátria, foram queimados publicamente e Lisboa foi convidada a assistir...
No entanto, esta peça marca também posição, pelo conteúdo fortemente ideológico, como denúncia da opressão que se vivia na época em que foi escrita (1961), sob a ditadura de Salazar. O recurso à distanciação histórica e à descrição das injustiças praticadas no início do século XIX em que decorre a acção permitiu-lhe, assim, colocar também em destaque as injustiças do seu tempo.
Felizmente Há Luar! é um drama narrativo, dentro dos princípios do teatro épico, que descreve a "trágica apoteose" do movimento liberal oitocentista, em Portugal, e interpreta as condições da sociedade portuguesa do início do século XIX e a revolta dos mais esclarecidos, muitas vezes organizados em sociedades secretas, contra o poder absolutista e tirânico dos governadores e do generalíssimo Beresford.
A figura central é o general Gomes Freire de Andrade «que está sempre presente embora nunca apareça» (didascália inicial) e que, mesmo ausente, condiciona a estrutura interna da peça e o comportamento de todas as outras personagens. A acção desenvolve-se à volta desta personagem e da sua execução: da prisão à fogueira, com descrições da perseguição dos governadores do Reino, da revolta desesperada e impotente da sua esposa e da resignação do povo que a "miséria, o medo e a ignorância" dominam.
Gomes Freire, amado por uns e odiado pelos que temem perder o poder, é acusado de chefe da revolta, de estrangeirado e grão-mestre da Maçonaria, por ser um soldado brilhante e idolatrado pelo povo. Os governantes - Miguel Forjaz, Beresford e Principal Sousa - perseguem, prendem e mandam executar o General e os restantes conspiradores através da morte na fogueira. Para eles, aquela execução, à noite, constituía uma forma de avisar, de dissuadir outros revoltosos; para Matilde de Melo, a mulher do General, e para mais pessoas era uma luz a seguir na luta pela liberdade. O general Gomes Freire e mais onze companheiros, acusados de conspirar contra Beresford e o Conselho de Regência no poder, tornaram-se, pela sua morte trágica, nos grandes precursores do liberalismo português e permitiram denunciar a situação do povo que vivia na miséria e dependente das classes dominantes.
Em Felizmente Há Luar! percebe-se, facilmente, que a história serve de pretexto para uma reflexão sobre os anos 60, do século XX. Sttau Monteiro, também ele perseguido pela PIDE, denuncia assim a situação portuguesa, durante o regime de Salazar, interpretando as condições históricas que anos mais tarde contribuiriam para a "Revolução dos Cravos", a 25 de Abril de 1974. A agitação e a conspiração de 1817, em vez de desaparecerem com medo dos opressores, permitiram o triunfo do liberalismo em 1834, após uma guerra civil. Também as revoltas e oposição ao regime nos anos 60, de que foi exemplo a candidatura do General Humberto Delgado (em 1958), o assalto ao "Santa Maria" e a Revolta de Beja (1961), em vez de serem uma cedência perante a ameaça e a mordaça, fortaleceram a resistência que levou à implantação da democracia.

Simbologia
Em Felizmente Há Luar! há diversos símbolos que favorecem a compreensão da situação vivida e a esperança da liberdade:
A saia representa a feminilidade e a familiaridade, e, por ser verde, a fertilidade e esperança. Comprada em Paris (terra da liberdade), com o dinheiro da venda de duas medalhas representa a felicidade do passado. Colocada por Matilde no momento da execução, destaca a "alegria" do reencontro (da união entre o casal) e aponta um novo caminho de esperança e alento.
O título surge por duas vezes, inserido nas falas das personagens. Na expressão de D. Miguel, o luar permitirá que o castigo seja visto por todos e, por via do terror, garantirá a eficácia desta execução pública pelo efeito dissuasor. Nas palavras de Matilde, o luar irá alertar as consciências, levando o Povo a lutar pela liberdade, contra a tirania.
A fogueira simboliza, por um lado, a destruição (pelo menos, momentânea das esperanças), mas também a purificação e, pela luz que emite e energia que gera, o poder de luta para garantir a revolução.
A moeda de cinco réis simboliza a hipocrisia social, a forma como se acalma a consciência com uma esmola e é símbolo do desrespeito (dos mais poderosos em relação aos mais desfavorecidos). Quando Matilde a entrega ao Principal Sousa, a moeda é comparada às que Judas recebeu (moedas de traição com que se compram as almas).
Os tambores, símbolo da repressão, provocam o medo e prenunciam a ambiência trágica da acção.




Como referenciar este artigo:
Felizmente Há Luar!. In Infopédia [Em linha]. Porto: Porto Editora, 2003-2010. [Consult. 2010-03-31].
Disponível na www:

sexta-feira, 26 de março de 2010

Felizmente Há Luar






Notas sobre a obra de Luís de Sttau Monteiro – Felizmente Há Luar!

A acção

A acção: o protagonista, General Gomes Freire de Andrade, e a sua execução: da prisão à fogueira, com descrições da perseguição dos governadores do Reino, da revolta desesperada e impotente da sua esposa e da resignação do povo que a "miséria e a ignorância" dominam.

A figura central é o general Gomes Freire de Andrade "que está sempre presente embora nunca apareça" (didascália inicial) e que, mesmo ausente, condiciona a estrutura interna da peça e o comportamento de todas as outras personagens.

A defesa da liberdade e da justiça, atitude de rebeldia constitui a hybris (desafio) desta tragédia. Como consequência, a prisão dos conspiradores provocara o sofrimento (páthos) das personagens e despertará a compaixão do espectador.

O crescendo trágico, representado pelas diversas tentativas desesperadas para obter o perdão, acabará em clímax, com a execução pública do General Gomes Freire e dos restantes presos.

Este desfecho trágico conduz a uma reflexão purificadora (cathársis) que os opressores pretendiam dissuasora, mas que despertou os oprimidos para os valores da liberdade e da justiça.


Intenção do Dramaturgo


Quando iniciámos o estudo do modo dramático, referimo-nos à intenção do autor ao conceber a sua obra, indicando as funções crítica, social, moralizadora, didáctica e lúdica como inerentes à obra de teatro.

Sendo Felizmente Há Luar! Uma peça de teatro, certamente que também veicula uma intenção, até porque, tratando-se de uma obra de um dramaturgo da década de 60, enquadra-se no conjunto das peças que evidenciam uma função social e um empenhamento ideológico. Daí dizermos que ilustra a doutrina do chamado teatro épico, de participação política, preconizado por Brecht.

Servindo-se de uma metáfora (século XIX) para atingir o presente (século XX), Felizmente Há Luar! revela uma dupla intenção crítica: à sociedade oitocentista (1817), feita de uma forma clara e bem explicita, e à sociedade da época de 60 (1961), feita de uma forma camuflada, através da técnica de distanciação. É com ela que Sttau Monteiro obriga o leitor-espectador a analisar e a reflectir sobre a situação política, social, económica e cultural do seu país, nomeadamente sobre o regime opressivo vigente que se fazia notar através das injustiças, das condenações e das torturas de todos aqueles que não comungavam das ideias salazaristas. É notória a preocupação do autor em despertar as consciências, levando o espectador a ser um agente de mudança, que reage criticamente e que toma decisões.


Paralelismo entre o passado e as condições históricas dos anos 60 : denúncia da violência

Em Felizmente Há Luar! é feita a análise crítica da sociedade portuguesa do primeiro quartel do século XIX, com o objectivo de levar os leitores / espectadores a reflectirem sobre a situação portuguesa actual (1961, ano de escrita da peça e, de um modo geral, durante todo o período do fascismo).

Eis um quadro exemplificativo das duas épocas, tendo em conta as duas classes que se apresentam dicotomicamente: o povo e a classe governante.

Tentativa de implantação do regime liberal em Portugal

- primeiro quartel do século XIX

A ditadura salazarista

- década de 60 (século XX)

O Povo

As figuras populares vivem em péssimas condições (“dormem estendidas no chão”; “uma velha, sentada num caixote, cata piolhos a uma rapariga nova”; Manuel anda “andrajosamente vestido”)

Idêntica situação se verifica no país

Manuel, símbolo da consciência popular, tenta participar numa conspiração destinada a romper com o regime vigente

Durante a ditadura salazarista houve também exemplos de antifascistas que sempre desejaram a liberdade, apesar da forte repressão

Denunciantes hipócritas e sem escrúpulos que tentam impedir a união popular em torno do general Gomes Freire de Andrade (Vicente, Andrade Corvo e Morais Sarmento)

Dentro das camadas populares também havia indivíduos que compactuavam com o regime opressor, denunciando elementos da mesma classe, a fim de obterem determinados benefícios

Dois polícias (“iguais a tantos outros”) que tentam dispersar o povo

A polícia e a PIDE, ao serviço do regime, através da repressão, conseguiam impedir a coesão nas camadas populares

As classes dominantes que exploravam e oprimiam o Povo

Elementos constituintes do Governo:

. Marechal Beresford, um inglês

. Principal Sousa, um padre

. D. Miguel Pereira Forjaz, um nobre

A mesma trindade surge a explorar o povo

Apesar de diferentes, unem-se para sobreviver e manter os seus privilégios, nem que para isso seja necessário matar

Aqui reside a função da PIDE, ao serviço do Governo

Apesar da ausência de provas para condenar Gomes Freire de Andrade, aniquilam-no

O mesmo sucede, pois o grande objectivo era silenciar todos os indivíduos “perigosos” ao regime

Mas

A força de Matilde, aquando da imolação de Gomes

Freire de Andrade, serve de estímulo à revolta contra a tirania dos governantes (“Julguei que era o fim e afinal é o princípio.”)

As sucessivas condenações e execuções intensificam a vontade de lutar nas classes dos explorados

Relação

Este paralelismo é até visível entre as personagens intervenientes na peça e individualidades do século XX, década de 60.

Assim:

Gomes Freire e os outros onze condenados

General Humberto Delgado e os outros presos políticos

Principal Sousa

Cardeal Cerejeira e a posição da igreja em Portugal

Beresford

Influência / ajuda estrangeira ao regime, particularmente a inglesa, que tinha interesses económicos, mesmo consciente do regime ditatorial

D. Miguel Pereira Forjaz

A burguesia dominadora que deseja manter o poder económico e social

Vicente / Andrade Corvo / Morais Sarmento

Os delatores ou “bufos” que, em geral, melhoram a sua condição social através da denúncia

Os dois polícias

A polícia e a PIDE

Matilde

As mães, esposas, irmãs dos presos políticos que, lentamente, vão tomando consciência da situação política e que hesitam entre salvar o familiar ou defender o povo

Manuel / Rita / Antigo Soldado / Outros populares

As pessoas que acreditam em Humberto delgado, mas que não intervêm e são marcadas pelo desespero

Sousa Falcão

O amigo do preso político que, mesmo consciente da situação, não ousa intervir por medo de represálias

Frei Diogo de Melo

A facção da igreja que está consciente da situação (grupo da Tribuna Livre, 1968)

Tribuna Livre – grupo de padres, criado em 1968, que se reunia mensalmente, a fim de trocar ideias, informações e reflexões sobre a situação que se vivia em Portugal na época. Começou em Lisboa e cedo se espalhou ao resto do país.

As iniciativas de oposição à ditadura e à guerra colonial multiplicavam-se por todo o território nacional e mesmo no interior da Igreja.


As Personagens

Se procedermos a uma leitura metódica da obra, constatamos a existência de uma problemática social, baseada em duas forças de acção (a favor da mudança e contra ela), envolvidas num determinado espaço e num determinado tempo.

Não podemos alhear-nos do facto de Felizmente Há Luar! Constituir, obviamente , a verdade de Luís de Sttau Monteiro (que não é objecto da nossa análise), que a faz chegar até ao leitor – espectador através das personagens e das suas acções, transformando-se ao longo da história em sinais, em símbolos.

A análise dessas personagens, que apresentamos a seguir, parte de uma hierarquia social, assente em três grandes grupos sociais:

Os governadores D. Miguel Forjaz

do reino Principal Sousa

Beresford


Morais Sarmento

Os delatores Andrade Corvo

Vicente


Manuel os mais conscientes

O povo Rita

Vicente o traidor da sua classe

Antigo Soldado

Dois polícias

Primeiro Popular grupo anónimo

Segundo Popular

Terceiro Popular

Uma velha

Uma Voz

Nota: Não englobamos nesta hierarquia o general Gomes Freire de Andrade, Matilde e Sousa Falcão porque formam um grupo à parte, destacado.

Os governadores do reino

Representam o poder político e a fragmentação nele existente: Principal Sousa o poder da Igreja, Beresford o poder dos oficiais ingleses e D. Miguel o poder da nobreza.

D. Miguel Forjaz revela um carácter prepotente e corrupto, representante da classe da nobreza, sujeita ás imposições estrangeiras pelo facto de D. João VI estar ausente do reino. Orgulhoso da sua origem nobre, despreza o povo, demonstrando assim um carácter antipopular. É um homem de carácter calculista, prepotente, o protótipo do tirano que se opõe ao progresso por razões meramente pessoais. Defensor do absolutismo, sente-se ameaçado pelas ideias de liberdade. É um homem de gabinete, que exerce o poder com prepotência, sentindo-se ameaçado pela figura de Gomes Freire, seu primo, pois reconhece nele qualidades que não possui.

Principal Sousa é um representante da igreja que defende um Deus feito à imagem e semelhança dos homens. Pretende manter o povo na ignorância para poder exercer a sua tirania. Preocupam-no também as ideias revolucionárias, oriundas de França, uma vez que a sua divulgação poria em causa o poder eclesiástico. É cúmplice e comprometido com o poder, aspecto evidenciado no seu diálogo com Beresford. Revela ser hipócrita e falso, quando demonstra uma preocupação não sincera em relação à condenação de um inocente.

Nota: Matilde, ao desmascará-lo, acaba por caracterizar toda a Igreja e os seus falsos princípios.

Beresford representa o domínio do exército inglês em Portugal. Revela preocupação em denunciar e castigar os traidores. É autoritário e detentor de grande poder. É irónico, pelo tom jocoso quando se refere a Portugal; país em relação ao qual assume uma posição de superioridade. Quando fala com Matilde revela-se um homem trocista e insensível. Adopta uma atitude de antipatia relativamente ao catolicismo caduco e ao incompetente exercício do poder. Pretende acabar com a possível conspiração de Gomes Freire de Andrade, não por razões nacionais ou militares mas sim pessoais, nomeadamente a manutenção do seu posto e da sua renda anual.

Nota: Beresford apresenta ao longo da acção um tom sarcástico e autoritário, manifestando um certo desprezo pelos seus companheiros governantes.

Os delatores

Representam os denunciantes que vendem informações ao Poder em troca de dinheiro. Homens sem escrúpulos, de personalidades mesquinhas, que não respeitam os seus próprios códigos morais.

Morais Sarmento, um capitão do exército, atormenta-se com o facto de o poderem rotular de traidor.

Andrade Corvo, um oficial, pensa apenas no dinheiro que irá receber, não se preocupando com aquilo que dele poderão dizer.

Vicente surge enquadrado no grupo dos delatores, uma vez que se trata de uma personagem que numa primeira fase pertence a um grupo (povo) e posteriormente passa para outro (delatores).

Trata-se, portanto, de uma personagem modelada, que revela evolução.

Inicialmente, vive as mesmas dificuldades, a mesma miséria e o mesmo terror dos seus companheiros de classe, mas, graças á sua astúcia, ganha a confiança dos governadores. Renega as suas origens, mostrando-se frustrado por ser um elemento da trapeira (quando fala com o Primeiro polícia). Tem consciência das injustiças sociais, mas a ganância em subir mais alto, mesmo sem olhar a meios, é mais forte. Apresenta um tom de voz irónico, fingindo interesse e piedade pelos seus “irmãos”, quando toma consciência do perigo das suas palavras ao renegar a “cambada” a que pertence. Mostra-se falso nas palavras, nas atitudes e nos gestos que encena e estuda como se fosse um membro da nobreza, à qual desejava ter pertencido. Pretende a promoção social, facto que vai fazer dele um delator, mesmo que para isso tenha de trair a confiança do povo. Francamente ambicioso, mostra-se altivo e insensível para com os da sua classe, quando passa a “chefe de polícia”, como diz o Primeiro Popular aos seus amigos. É um homem sem escrúpulos, como tantos outros, que se perdem pelo preço de um emprego, perdendo a sua dignidade.

O povo

Enquanto personagem colectiva, abstractizada, constitui o pano de fundo da acção dramática.

É a vítima de um regime opressor e absolutista, a classe explorada, que vive na ignorância, na miséria e na desilusão.

Nota: Manuel é um elemento do povo que vive sob a opressão do regime instaurado, contudo consciente da injustiça em que vive, ainda que impotente para mudar a situação. Simboliza, assim, a desilusão, a frustração daqueles que alimentam a chama da liberdade, todavia interceccionada pelo poder da corrupção.

Os amigos do general Gomes Freire de Andrade

Como já dissemos, formam um grupo destacado, revelando-se ao longo da acção fiéis aos seus valores e a si próprios, e unidos pela fidelidade e amizade a Gomes Freire.

Matilde, mulher de Gomes Freire e sua amiga, é uma personagem forte, com grande densidade psicológica, combativa e extremamente apaixonada.

Não surge no primeiro acto de peça e podemos dizer que é a figura central do segundo acto, uma vez que é ela que vai tentar salvar Gomes Freire da condenação, tentando tudo ao seu alcance para o tirar da prisão.

Verificamos que é uma mulher sofrida, angustiada pelo facto de o marido estar preso injustamente, chegando mesmo a contestar os valores que defendia, tal era o seu desespero.

Estamos perante uma personagem carregada de simbologia, que luta por causas perdidas – a justiça, a lealdade, a valentia. Esse simbolismo é evidente na cor da saia que tem vestida no fim da peça, aquando da execução de Gomes Freire – possivelmente a imortalidade e a esperança numa sociedade mais justa.

Na sua condição de mulher digna e lutadora, enfrenta heroicamente, recorrendo à hipocrisia e ao sarcasmo, os membros da Igreja, na pessoa de Principal Sousa, pondo a nu os vícios de toda uma classe – o clero.

Matilde atinge o auge do seu sofrimento quando, num longo discurso, carregado de intensidade dramática, questiona o Deus redentor.

Sousa Falcão é um amigo fiel do general Gomes Freire e de Matilde. Tal como Matilde, também só surge no segundo acto, acompanhando-a no seu sofrimento.

Mostra-se solidário com Matilde, nomeadamente quando esta decide ir falar com os governadores.

Nutre uma grande admiração pelo general e pelos princípios que defende. A morte leva-o a reflectir sobre si próprio, pois a sua falta de coragem e a sua cobardia distinguem-no do amigo.

General Gomes Freire de Andrade é a personagem central da peça, embora ausente fisicamente. O que sabemos sobre ele é através das outras personagens, que nos seus diálogos, discutem a figura do general. Assim, para os populares ele é um herói de grande coragem e justiça. Para Matilde e Sousa Falcão é um amigo, honesto, destemido, corajoso; aquele que luta pelos seus ideais, enfrentando o poder instituído. Para os governadores é uma ameaça ao poder absolutista, pelas suas ideias liberais, e até mesmo pela firmeza de carácter, que estes não possuem. Constitui, em suma, um “alvo” a abater.

É amado pelo grupo de personagens que aspiram à liberdade, à abolição do regime absolutista instituído, e odiado por aquelas que vêem a sua presença como uma ameaça aos privilégios até então obtidos.


Os símbolos

1 – A saia verde

- A felicidade – a prenda comprada em Paris (terra da liberdade), no Inverno, com o dinheiro da venda de duas medalhas;

- Ao escolher aquela saia para esperar o companheiro após a morte, destaca a “alegria” do reencontro (“agora, que se acabaram as batalhas, vem apertar-me contra o peito”).

Convém recordar, a propósito, que a saia é uma peça eminentemente feminina e que o verde está habitualmente conotado com tranquilidade e esperança, traduzindo uma sensação repousante, envolvente e refrescante. O Dicionário dos Símbolos diz-nos que:

“Entre o azul e o amarelo, o verde resulta das interferências cromáticas. Mas entra com o vermelho no jogo simbólico de alternâncias. A rosa floresce entre folhas verdes. Equidistante do azul-celeste e do vermelho infernal, ambos absolutos e inacessíveis, o verde, valor médio, mediador entre o quente e o frio, o alto e o baixo, é uma cor tranquilizadora, refrescante, humana.”.

2 - O título / a luz / a noite / o luar

O título surge por duas vezes ao longo da peça, inserido na fala das personagens:

- D. Miguel salienta o efeito dissuasor que aquelas execuções poderão exercer sobre todos os que discutem as ordens dos Governadores.

Esta primeira referência ao título da peça, colocada na fala do Governador, está relacionada com o desejo expresso de garantir a eficácia desta execução pública: a noite é mais assustadora, as chamas seriam visíveis de vários pontos da cidade e o luar atrairia as pessoas à rua para assistirem ao castigo, que se pretendia exemplar.

- Na altura da execução, as últimas palavras de Matilde, “companheira de todas as horas” do General Gomes Freire, são de coragem e estímulo para que o Povo se revolte contra a tirania dos governantes.

A luz, simbolicamente, está associada à vida, à saúde, à felicidade, enquanto a noite e as trevas se associam ao mal, à infelicidade, ao castigo, à perdição e à morte. Na linguagem e nos ritos maçónicos, após ter participado de olhos vendados em alguns rituais, após prestar juramento, o neófito poderia “receber a luz”, o que significava ser admitido...

A lua, simbolicamente, por estar privada de luz própria, na dependência do Sol, e por atravessar fases, mudando de forma, representa a dependência, a periodicidade e a renovação. A lua é, pois, símbolo de transformação e de crescimento.

A lua é ainda considerada como “o primeiro morto”, dado que durante três noites em cada ciclo lunar ela está desaparecida, como morta; depois reaparece e vai crescendo em tamanho e em luz...Ao acreditar na vida para além da morte, o homem vê na lua o símbolo desta passagem da vida para a morte e da morte para a vida...

Por isso, na peça, nestes dois momentos em que se faz referência directa ao título, a afirmação de que “felizmente há luar” pode indiciar duas perspectivas de análise e de posicionamento das personagens:

- As forças das trevas, do obscurantismo, do anti-humanismo utilizam, paradoxalmente, o lume (fonte de luz e de calor) para “purificar a sociedade” ( a Inquisição considerava a fogueira como fonte e forma de purificação).

- Se a luz é redentora, o luar poderá simbolizar a caminhada da sociedade em direcção à redenção, em busca da luz e liberdade...

Assim, dado que o luar permitirá que as pessoas possam sair de suas casas (ajudando a vencer o medo e a insegurança, na noite da cidade), quanto maior for a assistência, isso significará:

- para uns, que mais pessoas ficarão “avisadas” e o efeito dissuasor será maior;

- para outros, que mais pessoas poderão um dia seguir essa luz e lutar pela liberdade.

3 – A fogueira / o lume

Após a prisão do General, num diálogo de tom “profético” e com “voz triste” ( segundo a didascália), o Antigo Soldado, acabrunhado, afirma: “Prenderam o general... Para nós, a noite ficou ainda mais escura...”. A resposta ambígua do primeiro Popular pode assumir também um carácter de profecia e de esperança: “É por pouco tempo, amigo. Espera pelo clarão das fogueiras...”

Matilde, ao afirmar que aquela fogueira de S. Julião da Barra ainda havia de “incendiar esta terra!”, mostra que a chama se mantém viva e que a liberdade há-de chegar.